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AS INVASÕES BÁRBARAS

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Em sua origem, a palavra “bárbaro” é uma onomatopeia que designa aquele estrangeiro cujo idioma soaria como o resmungo de um “blá-blá-blá” ininteligível. Se essas pessoas de aparência exótica e de maneiras esdrúxulas nem falam direito, será que elas pensam? E, se o humano é o animal racional, seriam eles tão humanos quanto nós? Há aí dois pressupostos: o de que os bárbaros são todos iguais (quiçá devêssemos dizer “o” bárbaro) e o de que a língua, os meios de expressão e os modos estariam em fiel paralelo com a alma, a mente ou a psique. Eles seriam, por assim dizer, sua parte visível. Adicionando a esse cenário a velha superstição ainda repetida pelo senso comum segundo a qual “a arte é o que melhor encarna o gênio de um povo”, isso significaria que as labirínticas relações de influência, interpenetração e sucessão de diversos estilos deveriam por sua vez refletir uma dinâmica de miscigenação dos povos não menos complexa. Com ares de psicologia das raças, a história da arte nasce, assim, sob o signo das invasões bárbaras: ao apoiar-se em algumas singularidades visíveis, ela associa objetos artísticos a povos, agrupando, nos museus, as produções das artes visuais segundo sua proveniência geográfica e o pertencimento “étnico” de seus criadores. Ainda hoje, no mercado mundial dos objetos de arte, a denominação étnica das obras – arte negra, afro-americana, latina, indígena etc. – confere a esses objetos de troca uma mais-valia significativa. A genealogia de uma história da arte que é tanto artística quanto racial vive em simbiose com um racismo que é tão biológico quanto cultural. Ao situá-lo, historicizá-lo e perspectivá-lo, Éric Michaud mostra que o “branco” europeu – ele mesmo tomado como um todo monolítico quando ocupa a posição de “outro” – existe no âmago do uma cisão essencial: o espectro do ininteligível, do “xeno” irredutível, nunca pode ser plenamente exorcizado, e, por baixo das mais insuspeitas línguas civilizadas, como imperceptível e ensurdecedor ruído de fundo, ainda ressoa o “blá-blá-blá” da glosa bárbara.
Autor(es):
ÉRIC MICHAUD
Dimensões:
1,7cm x 12,5cm x 18,5cm
Páginas:
300
ISBN:
9788546905881
Código:
1098167
Código de barras:
9788546905881
Edição:
1ª EDIÇÃO - 2024
Data de Edição:
03/05/2024
Idioma:
PORTUGUÊS
Peso:
240
  • Informações do produto Seta - Abrir
    Em sua origem, a palavra “bárbaro” é uma onomatopeia que designa aquele estrangeiro cujo idioma soaria como o resmungo de um “blá-blá-blá” ininteligível. Se essas pessoas de aparência exótica e de maneiras esdrúxulas nem falam direito, será que elas pensam? E, se o humano é o animal racional, seriam eles tão humanos quanto nós? Há aí dois pressupostos: o de que os bárbaros são todos iguais (quiçá devêssemos dizer “o” bárbaro) e o de que a língua, os meios de expressão e os modos estariam em fiel paralelo com a alma, a mente ou a psique. Eles seriam, por assim dizer, sua parte visível. Adicionando a esse cenário a velha superstição ainda repetida pelo senso comum segundo a qual “a arte é o que melhor encarna o gênio de um povo”, isso significaria que as labirínticas relações de influência, interpenetração e sucessão de diversos estilos deveriam por sua vez refletir uma dinâmica de miscigenação dos povos não menos complexa. Com ares de psicologia das raças, a história da arte nasce, assim, sob o signo das invasões bárbaras: ao apoiar-se em algumas singularidades visíveis, ela associa objetos artísticos a povos, agrupando, nos museus, as produções das artes visuais segundo sua proveniência geográfica e o pertencimento “étnico” de seus criadores. Ainda hoje, no mercado mundial dos objetos de arte, a denominação étnica das obras – arte negra, afro-americana, latina, indígena etc. – confere a esses objetos de troca uma mais-valia significativa. A genealogia de uma história da arte que é tanto artística quanto racial vive em simbiose com um racismo que é tão biológico quanto cultural. Ao situá-lo, historicizá-lo e perspectivá-lo, Éric Michaud mostra que o “branco” europeu – ele mesmo tomado como um todo monolítico quando ocupa a posição de “outro” – existe no âmago do uma cisão essencial: o espectro do ininteligível, do “xeno” irredutível, nunca pode ser plenamente exorcizado, e, por baixo das mais insuspeitas línguas civilizadas, como imperceptível e ensurdecedor ruído de fundo, ainda ressoa o “blá-blá-blá” da glosa bárbara.
  • Especificações Seta - Abrir
    Autor(es):
    ÉRIC MICHAUD
    Dimensões:
    1,7cm x 12,5cm x 18,5cm
    Páginas:
    300
    ISBN:
    9788546905881
    Código:
    1098167
    Código de barras:
    9788546905881
    Edição:
    1ª EDIÇÃO - 2024
    Data de Edição:
    03/05/2024
    Idioma:
    PORTUGUÊS
    Peso:
    240
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